segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Febre fabril

Imagine uma máquina fabril com componentes reforçados, juntas lubrificadas, tecnologia de ponta, desenvolvida para trabalhar exaustivamente por 100 anos sem saber porque.
Cada dia ela deseja descançar, e isso prejudica sua mecânica.
Cada dia ela deseja parar, e isso prejudica sua dinâmica.
Mas ela sabe que seus sonhos estão em segundo plano no mundo. E assim continua movimentando sua engrenagem. Tem um sério compromisso com a sociedade: Fabricar 1200 tampinhas de tubo de creme dental por hora.
As vezes, enquanto desempenha sua árdua função, fica com a cabeça pensando na natureza, no mar, nos animais, e acaba engolindo algumas tampinhas por distração.
Com isso, é necessário fazer manutenção. Sua vida útil diminui pra 80 anos. Frustrante, porque nimguém vai dizer que um dia ela fez 1200 tampinha de tubos de breme dental por hora, mas sim que agora só consegue fazer 930.
A máquina sai pela tangente e se embreaga de óleo lubrificante. Isso ajuda a aliviar sua angustia profissional e esquecer seus sonhos.
Daí o dia amanhece, ela respira com dores nos parafusos e começa tudo de novo.
Os anos passam até que a máquina se aposenta. Vai pro ferro velho, onde espera a morte no setor de enferrujados.
É ficção.
Tenho a sensação de que quanto mais velho fico, menos eu sei das coisas. Hoje não sou mais esperto do que há 10 anos atrás.
O corpo envelhece. O tempo maltrata a alma. Os dias de trabalho levam a identidade que sobra. O que será de mim com 40 anos, se hoje penso assim? Mega Sena? Micróbio? Errante do mundo? Sair por aí?