quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A seta e o alvo

"Eu falo de amor à vida,
Você de medo da morte.
Eu falo da força do acaso
E você de azar ou sorte.

Eu ando num labirinto
E você numa estrada em linha reta.
Te chamo pra festa,
Mas você só quer atingir sua meta.
Sua meta é a seta no alvo,
Mas o alvo, na certa, não te espera.

Eu olho pro infinito
E você de óculos escuros.
Eu digo: "Te amo!"
E você só acredita quando eu juro.

Eu lanço minha alma no espaço,
Você pisa os pés na terra.
Eu experimento o futuro
E você só lamenta não ser o que era.
E o que era?
Era a seta no alvo,
Mas o alvo, na certa, não te espera.

Eu grito por liberdade,
Você deixa a porta se fechar.

Eu quero saber a verdade
E você se preocupa em não se machucar.

Eu corro todos os riscos,
Você diz que não tem mais vontade.
Eu me ofereço inteiro
E você se satisfaz com metade.
É a meta de uma seta no alvo,
Mas o alvo, na certa não te espera!

Então me diz qual é a graça
De já saber o fim da estrada,
Quando se parte rumo ao nada?

Sempre a meta de uma seta no alvo,
Mas o alvo, na certa, não te espera.

Então me diz qual é a graça
De já saber o fim da estrada,
Quando se parte rumo ao nada?"

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Em tempo, sem tempo

Estou numa canoa pesada, que desliza vagarosamente, à deriva, sobre as águas de um lago esquecido, escutando o barulho do cabelo nascer. Olho para o céu desanuviado e vejo o passado se fazendo presente. Egoísta e egocêntrico, o passado insiste em ser o futuro.
Qual a fórmula da ruptura?
Passeio por águas rasas, onde vejo com maior clareza o funddo do lago, e sinto medo das águas mais profundas, onde o fundo é desconhecido, e tudo parece subjetivo, distante da compreensão.
Um vento fresco me traz cheiro de eucaliptos, invadindo minhas lembranças, e o coração acelera, num segundo desacelera.
De repente me veio a consciência de que sou amor, em seguida que sou ódio, e receio a vida, assim como receio a morte. Que espécie de animal sou eu? Que não consegue ser uníssono? Dual, contraditório.
Porém, é sabido por mim que entender não é tão importante assim, sentir a paz desse lago basta.
Sou menino latino, criado no interior, humilde, peguei os remos cedo, naveguei sem bússula sob tempestades impiedosas, traçei um mapa de cicatrizes sobre a pele, pessoas me fizeram em pedaços, me reconstrui a partir da desconstrução, estou cada vez mais longe do porto, até completar a volta.
Sou este lago, galgando as encontas, louco por mais.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Condutor

Os ponteiros não param, mas é preciso se levar de um lugar ao outro. É um tempo vazio enquanto viajamos pela cidade.
Ontem, após uma confraternização da turma do inglês no bar do Juarez, entrei no carro.
Coloco a carteira num compartimento do lado inferior esquerdo do volante, travo as portas, aperto os cintos, dou a partida e pratico musculaçao com a direção mecânica, até sair da vaga apertada. Eu sempre paro na rua, diga-se de passagem. Em São Paulo é muito comum as pessoas gastarem 15% de seus vencimentos com estacionamento.
Caía uma chuva leve, segui em direção a minha casa. Parei no cruzamento da Faria Lima com a Pedroso de Morais, onde notei as luzes do semáforo refletidas no espelho do asfalto equalizadas com a música Get Ready do Sublime. Daí comecei a reparar nas coisas ignoradas da rua. As folhas no asfalto levantando voô quando eu passava a 60 Km/h, as pessoas andando embaixo de guarda-chuvas, poças d'água e uma pequenina me mostrou uma moeda no semáforo.
Acendi um cigarro, continuei desenvolvendo o caminho de casa, e o coração sofreu quando percebi a vida passando tão depressa, ali, dentro do carro, sozinho, em busca de alguma coisa, numa estrada sem destino, cheio de saudades.
Eu era um pleno condutor do meu carro, mas não da minha vida. Esta me conduz.
Bonito ver as luzes no espelho do asfalto.